História do Projeto

Sanchos: razão a serviço do sonho


por Mara Ribeiro

Sonhar é uma coisa muito interessante. Uma pessoa por um sonho é capaz de movimentar o mundo. Isto pode ser um clichê, mas não deixa de ser verdade. Dom Quixote, o famoso personagem de Cervantes, quando questionado sobre o porquê de comportar-se de forma tão incomum e de empreender uma batalha aparentemente inglória, responde de forma muito singela à sobrinha: - E por que não?

Por esse questionamento surge o projeto Sessão Pipoquinha. Por que não fazer? Se tínhamos o essencial: gosto pelo cinema. A ideia virou um anúncio na parede chamando para a primeira sessão. No dia, o mundo resolveu desabar em uma chuvarada, resultando em uma sala vazia. Será que não ia dar certo, não teríamos público?


Na outra semana, um acidente na arrumação da sala: uma mesa quebrada, uma televisão de tela plana no chão, uma perna arranhada e roxa. Apesar de tudo, “A grande ilusão”, com Sean Penn, encantou o público formado por: eu, meu colega Marcelo, a monitora voluntária, Luana, e dois alunos.

Era início de setembro, o Pipoquinha estava na rua e mantemos até o final do ano de 2008, sessões regulares nas salas da universidade para um público muito reduzido. Em algumas sessões apenas uma aluna, a Deise.

No ano seguinte, conseguimos na universidade uma bolsa de extensão para a monitora, a Lilian, verba para material de consumo, a integração de mais uma colega, a Cárlida, que trouxe seu conhecimento de cinema e televisão, e também fizemos uma parceria com o Sindilojas, que nos acolheu em seu auditório no centro de São Borja. Isto fez com que conquistássemos mais público e que fizéssemos uma amizade para toda a vida com seu Lúcio, uma pessoa admirável, que faz de tudo pelo Pipoquinha, desde conseguir uma extensão para ligar um equipamento até pegar emprestado um projetor quando esquecemos algum cabo e o nosso não serve para nada.

O projeto fechou dois anos em 2010, ganhamos um público um tanto quanto fiel, implementamos um blog, tivemos a companhia da Deise, como bolsista, e passamos a contar com a colega Juliana como integrante do projeto. Tivemos conquistas e ao longo desses anos aprendemos a lidar com as dificuldades, que foram muitas; sem verba para comprar os filmes, lançamos mão do nosso acervo particular ou das locações pelas quais pagamos do próprio bolso. Toda vez que tem sessão, precisamos reservar o equipamento, transportá-lo para o auditório, montá-lo e ao final fazer o caminho inverso. Nesse processo, nossas inabilidades se manifestam de maneira implacável. Por conta disso, muitas sessões iniciaram atrasadas, com o áudio meio ruim ou a cor um pouco estranha. Tudo isto, sempre foi superado, pelo espaço que o projeto criou em que se exibe o filme e depois se debatem as ideias
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A cada ano, o sonho é realimentado e o “por que não?” continua nos movimentado. Por que não fazer uma sessão na praça? Lá fomos nós em uma programação da Feira do Livro. Uma barraca do exército e dois filmes: “Wall-e” e “Narradores de Javé”. O robozinho que limpa a terra e sua amiga Eva iniciam sua batalha pela recolonização do Planeta Terra e... O dvd travou, as crianças dispersaram e ficamos a mercê do olhar de um menino e de sua mãe, que queriam saber o final do filme: que frustração. À noite, o horário chegou, mas as pessoas não. Colocamos o som no volume máximo, levantamos as abas da barraca e deixamos Antonio Biá contar as peripécias do povo de Javé. Os são-borjenses chegavam, olhavam um pouco, permaneciam em pé, um ou outro ficou até o final. Concluímos que somos inexperientes na atividade de exibir filmes na praça, mas essa será outra história.

O Sessão Pipoquinha projeta filmes na parede, com equipamento emprestado, em um auditório cedido. Ele é a cada sessão a concretização da vontade de cada um de nós de compartilhar: compartilhar o encantamento do cinema, nossas ideias, a alegria do encontro. Não somos Dom Quixotes a lutar contra moinhos de vento. Somo Sancho Pança que embarca na aventura para construir a realidade.